terça-feira, 26 de outubro de 2010

2010.10.26 - A nossa falta de vergonha na cara - DeFato Online

Domingo, 31 de outubro, Carlos Drummond de Andrade, o mais famoso dos itabiranos e um dos maiores poetas do Brasil, faria 108 anos se a longevidade dos gênios fosse justa com a sua importância. Nesse dia, vamos sacramentar o 13 ou o 45, de Dilma ou Serra, como o nosso futuro presidente da República. Dizem que o voto é secreto, livre e direto. Tudo bem, mas na maioria dos casos não  é consciente. De minha parte, como uma das mais de cem milhões de pessoas que propugnam pelo trinômio educação, saúde e segurança, não excluindo meio ambiente, declaro que votarei sem entusiasmo e sem consciência.

Esse indispensável sentimento teria caso algum candidato garantisse a duplicação da BR-381 imediatamente. A conhecida Rodovia da Morte reúne esses três temas que todo candidato aborda, embora quase sempre da boca para fora. Então, para clarear bem, digo, defendo e reafirmo que a duplicação da BR-381, trecho de Governador Valadares a Belo Horizonte, é o projeto que mais interessa a milhares de seres humanos, sejam os doentes que trafegam (saúde), os estudantes que vêm e vão (educação) e qualquer viajante que anseia sobreviver (segurança). E que, assustadoramente, não foi discutido por nenhum dos candidatos.

Abro um parêntesis para dizer que um ou outro cidadão fala, escreve ou comenta, que se duplicar essa rodovia a que me refiro tudo continua a mesma coisa porque o nosso motorista é mal-educado no trânsito. É verdade, mas, ao se construírem pistas separadas e largas, haveria de forma significativa redução expressiva do número de acidentes. Basta pesquisar os índices da própria 381, no trecho de Belo Horizonte a São Paulo, chamado de Fernão Dias. Como era o trânsito e como hoje se transformou em pista de segurança. Que vez por outra ocorre um acidente, isso não se pode negar. Afinal de contas, esse parêntesis nem sentido tem, pois o tema não se discute com cabeças de bagre, acredito. Fecho o parêntesis e peço desculpas aos inteligentes.

Agora o escândalo maior: fiquei sabendo por meio de fonte fidedigna que o governo federal vai “melhorar” ou “dar uma melhorada” na Rodovia da Morte para tentar resolver o problema do acesso a Belo Horizonte, uma das sedes da Copa do Mundo de Futebol de 2014. Não duplicará por falta de tempo, pensam assim os manda-chuva. Qualquer cidadão brasileiro, pé-rapado, lambedor de rapadura ou graduado ou doutor ou PHD, sabe que nada mais se pode fazer nessa maldita rodovia, onde todo dia ocorre acidente grave, que não seja duplicar as pistas. Uma “melhorada”, que chamaria de piorada, se fez recentemente e ficou o feito pelo não feito: além das “arapucas” abertas nas laterais da estrada, onde dezenas de veículos continuam caindo, a mexida serviu para fazer com que o imperito se tornasse imprudente e a insegurança crescesse.

O governo, distribuindo funções para os ministérios, está oferecendo verbas polpudas para financiar projetos turísticos que tenham como foco a Copa do Mundo de 2014. Em outras palavras, pretendem os nossos dirigentes maiores que os turistas estrangeiros venham não somente para  ver jogos de futebol, mas também conhecer as nossas belezas naturais e artificiais. Negativo. Qualquer um que tiver a mais vaga informação sobre o que se passa nessa e em outras rodovias jamais se embrenhará por nossas bandas, a menos que queira documentar o absurdo — quem sabe é algum jornalista curioso? — ou um turista que pretenda anotar em seu caderninho de apontamentos a frase: “A esses confins não se deve vir, só dele sair”. Ou um suicida qualquer.

Voltando ao que disse no início, domingo escolheremos o nosso presidente da República. O que ele fará para resolver o nosso problema maior?  Resposta: nada. E aí está a prova: a ex-ministra Dilma Rousseff, chamada pelo seu padrinho-mor, o senhor Lula, de “Mãe do PAC”, permitiu, ou mesmo comandou, o corte da verba dessa obra esperada do ainda capengante Programa de Aceleração do Crescimento. O outro, José Serra, provavelmente nem sabe que nós, mineiros, convivemos com esse problema gravíssimo e com o pavor de ler todos os dias nos jornais e sites a relação de mortos e feridos na BR-381.

Carlos Drummond de Andrade, se vivo fosse, votaria em quem ele quisesse e, provavelmente, não revelaria o nome de seu candidato preferido. Mas que faria um poema para protestar, disso não tenho dúvidas, que poderia mesmo ser um  reaproveitado de sua imensa riqueza poética:

“No meio do caminho tinha uma pedra,
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra”.

Se ele próprio não completasse, eu mesmo pediria licença e daria o meu grito de protesto: a pedra no meio do caminho é a nossa falta de vergonha na cara.

Fonte: DeFato Online

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