domingo, 13 de março de 2011

Vítimas do Descaso - A dor por trás dos números - Estado de Minas

Parentes de mortos nas rodovias mineiras exigem providências para encerrar violência

Thobias Almeida e Ernesto Braga

Euler Junior/EM/D.A Press20110312194756352Maior quantidade de mortes (334 em 2010) foi registrada em acidentes na BR-381. No trecho de maior risco, carros se cruzam a poucos centímetros na pista sinuosa

A negligência e inoperância do poder público, que relegam ao abandono algumas das mais críticas rodovias federais que cortam Minas Gerais, marcam para sempre a história de milhares de famílias. O sentimento daqueles que perderam parentes em desastres nas BRs é uma mistura de lamento, medo e revolta. O Estado de Minas ouviu familiares das vítimas de alguns dos mais recentes acidentes registrados nas rodovias mineiras, que, além da dor, têm em comum uma exigência: a de mudanças que ponham fim à carnificina nas estradas.

Um quadro de violência que interrompe o futuro de jovens como Ana Beatriz Bittar Gimenes, de 19 anos. Ela saiu de Franca (SP) em 4 de março para curtir o carnaval em Ituiutaba, no Triângulo Mineiro. Na BR-365, entre Uberlândia e Monte Alegre, um choque frontal com um caminhão interrompeu o futuro da jovem e de outros quatro amigos que a acompanhavam, todos com idades entre 19 e 20 anos.
Ana acabara de ingressar no curso de jornalismo e vivia um momento definido como mágico pelo tio Rafael Villela Bittar, de 45 anos. “É uma dor horrível, que não tem cura, não tem remédio”, descreve. Os pais da estudante, que insistiram até o último minuto para que ela não viajasse, continuam em estado de choque. “Eles terão de ser fortes para superar isso. Somos uma família muito católica e a Ana está nas mãos de Deus”, tenta consolar-se o tio.

Na opinião de Bittar, caso a BR-365 fosse uma rodovia duplicada, sua sobrinha poderia estar hoje em Campinas (SP), onde estudava. “As estradas em Minas estão uma calamidade. Falta governo, falta atitude. Moro em Franca, em São Paulo, e nossas rodovias são duplicadas e muito melhores”, critica o tio. Ele aponta ainda a imprudência de motoristas como uma das causas das constantes tragédias nos perigosos caminhos mineiros.

Na sinuosa, movimentada e estreita BR-381, em São Gonçalo do Rio Abaixo, na Região Central do estado, a médica Sílvia Bastos Heringer perdeu de uma só vez os filhos Luiz Heringer Walther, de 8 anos, e Lucas Heringer Walther, de 11, além da mãe, Noady Bastos Melo Heringer, de 66. A colisão frontal com um caminhão ocorreu em 26 de janeiro e matou ainda o motorista do veículo, Geraldo José dos Santos, de 57 anos. Novamente, a evidência de que uma mureta divisória poderia evitar a colisão frontal. “Foi o cenário mais chocante que já vi. Fiquei chorando uma semana”, relembra o médico Lassy D’Ávila Heringer, primo de Sílvia, que esteve no local logo depois do acidente.

Heringer não poupa críticas ao governo federal. “A duplicação da BR-381 é prometida há mais de oito anos. O problema é que faltam estadistas no país. Infelizmente, ninguém aqui investe em infraestrutura”, afirma o médico, confessando o medo de transitar pela 381, conhecida nacionalmente como Rodovia da Morte, pois não sabe se voltará para casa.

A médica ainda não assimilou o duro golpe e está extremamente abalada. “Ela não está em condições de fazer nada”, conta Heringer. Sílvia não entrou no carro que partiu de Belo Horizonte rumo a João Monlevade, na Região Central, devido ao excesso de bagagens. Ela retornava da Europa, onde havia passado as férias com as crianças. A mãe, Noady, foi buscá-la no aeroporto. Viajando em um ônibus, a médica ficou presa no engarrafamento causado pelo acidente com seus parentes.
Quem também busca forças para superar a perda de dois familiares, no trágico acidente de 28 de janeiro no Anel Rodoviário de Belo Horizonte, quando uma carreta bitrem desgovernada e a 115 km/h arrastou 15 carros, matando cinco pessoas e ferindo 12, é o motorista Ricardo Geraldo do Santos, de 32. O filho dele, que faria 13 anos dias depois, e a mãe, de 68, morreram no local do acidente, na temida descida do Bairro Betânia, na Região Oeste da cidade, sentido Vitória.

Ricardo e a mulher, Wandercy Barreto da Silva, de 45, seguiam com o único filho e a mãe do motorista para a Igreja de São Judas Tadeu, no Bairro da Graça, Nordeste da capital. O Gol da família estava parado numa retenção do Anel e foi atingido pela bitrem. “Só senti um impacto forte e, quando assustei, eles já estavam mortos. Não tinha como fazer mais nada.”

As marcas do acidente ainda são fortes na memória de Ricardo, que ainda não passou pelo Anel Rodoviário depois da tragédia. “A imprudência impera no Anel, mas as condições estruturais da via também deixam muito a desejar. Trabalho dirigindo caminhão e, por onde passo, percebo que as rodovias são muito inseguras. Nada é feito para resolver o problema”, disse o motorista. Há 15 dias, seu advogado entrou com ação indenizatória contra a empresa proprietária da carreta bitrem.

Outra família que não consegue se conformar com a violência das estradas mineiras é a do pintor João Evangelista de Lima, de 46, morto em 22 de fevereiro na BR-262, no trevo de São Gonçalo do Pará, na Região Centro-Oeste. “Ele estava de moto e foi atingido por um veículo. Quando caiu, veio outro carro e o atropelou. Meu irmão era motoqueiro experiente, mas foi vítima da falta de sinalização na BR. Tinha apenas um ano e meio de casado e deixou uma filha de 5 meses”, lamentou auxiliar de produção Luiz Carlos de Lima, de 44.

Tragédia nas BRs

Em 2010, 1.344 pessoas morreram e 16.695 ficaram feridas em 27.366 acidentes nas estradas federais mineiras. Confira os trechos mais violentos

Mortes por rodovias

BR-381 (de BH para Vitória e São Paulo): 334
BR-116: 247
BR-040 (de BH para o Rio de Janeiro e Brasília): 217
BR-262: 125
BR-365: 88
BR-135: 61
BR-251: 58
BR-050: 53
BR-153: 50
BR-267: 34
BR-452: 22
BR-459: 21
BR-354: 10
Br-364: 10
BR-356: 5
BR-146: 4
BR-460: 3
BR-474: 2
Fonte: PRF

Fonte: Estado de Minas

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